Boa parte dos primeiros tuítes de muita gente que entrou na rede social em seus anos iniciais, lá entre 2006 e 2009, costumavam ser variações de uma mesma elucubração: “tentando entender esse tal de Twitter, risos.”
Vivíamos a ressaca após o auge do Orkut, o Flogão e suas variantes ainda estavam no ar e o Facebook começava a viver seu momento. A famigerada ‘rede do passarinho’, como gostavam de dizer os jornalistas pouco afeitos à internet, ainda era um lugar esquisito e pouco amistoso –bom, não mudou muita coisa.
Neste mês completo 15 anos de um relacionamento intenso e ininterrupto. Desde os primórdios, sempre foi minha rede social favorita. Deu uma nova dimensão às minhas obsessões e serviu também para dar vazão aos meus delírios. Nada muito grave.
Ainda que menor em tamanho e impacto publicitário em relação às outras redes, o Twitter se tornou um site incrivelmente relevante por conta do tipo de gente que se manifesta por lá. A interface simples, a timeline cronológica e o tempo real garantiram que artistas, políticos e mesmo jornalistas dessem um peso grande à plataforma em suas estratégias de comunicação. E também por alguns célebres derretimentos de reputação.
É a caixa de comentários da existência humana. E onde grandes comunidades são formadas em torno de ídolos e celebridades, é verdade, mas sobretudo ao redor de assuntos. O discurso de ódio e a ação de trolls e robôs são um problema em busca de soluções urgentes, mas os aspectos positivos ainda se sobressaem, na minha humilde opinião.
Com a aquisição ruidosa da empresa por Elon Musk, estamos todos voltando às questões que eram praxe 16 anos atrás: tentando, mais uma vez, entender o Twitter. Com seu jeitão extravagante, o bilionário transforma o choque de gestão em uma espécie de reality show tosco, com direito a rusgas com funcionários e anúncio de demissão via tuíte.
Uma das coisas mais curiosas é a ideia de misturar o selinho de verificado, que serve para fins muito específicos, com um pacote premium aleatório de serviços do site. O nome Twitter Blue remete ao Orkut Gold, um boato que garantia haver uma versão mais encorpada do saudoso site outrora favorito dos brasileiros.
Karl Marx escreveu que a história se repete como farsa, mas dessa vez é a farsa que se repete como história. Somos os primeiros internautas do pós-capitalismo.
Enquanto o novo dono vai tentando entender qual é a do passarinho, o passarinho observa de volta. “Se você olhar longamente para um Elon Musk, o Elon Musk também olha para dentro de você”. Como não se deixar contaminar pelo clima de insistente distopia que nos circunda nessa terceira década do século 21?
Lembro quando o limite de 140 caracteres dobrou para 280 e a princípio eu achei que seria o fim da minha rede social preferida. Também foi um choque anos antes, quando passaram a aceitar imagens e depois vídeos.
Tenho receio do que vem por aí, mas ao mesmo tempo imagino que daqui a algum tempo estaremos dando risada ao pensar nesse período esquisito. Na pior das hipóteses, daqui a mais alguns anos estaremos todos mortos.
Ainda assim, caso a empresa realmente vá à falência e o site saia do ar de maneira definitiva, lamento profundamente que minhas reflexões a respeito de A Dona do Pedaço não ficarão gravadas para a posteridade.
You have to lose
You have to learn how to die
If you want to want to be alive
(trecho de ‘War on War’, canção da banda Wilco)
Acredito que na melhor das hipóteses, estaremos mortos.